Esquecimento

Eu vejo a luz

Trespassando meus olhos

E enquanto o mundo

Dorme lá fora

Enquanto meu corpo

Queima aqui dentro

Eu regojizo

Apenas por um instante

Perdido em pensamentos

E afogado em memórias

Inalcançáveis

Pois finalmente algum alívio

Afagou-me

Uma sensação de não saber

Acordar em meio ao caos

E a calmaria da madrugada

Sem certeza alguma

Sem pessoa alguma

O silêncio aqui é rei

E ele é sábio

Diz absolutamente nada

Mas de repente o medo começa

A forçar passagem

Pois o silêncio lá fora

Nada significa diante do silêncio

De dentro

E pouco a pouco o desespero

Retorna

Meu velho companheiro

O sugador

Aquele que toma tudo o que um dia

Eu poderia ser

Eu poderia conquistar

Simplesmente não posso suportar

A ideia

De me sufocar em meus próprios

Princípios

E abandonar aquilo que sempre vi

Como meu futuro

Como minha identidade

Simplesmente não posso suportar

O calafrio que acompanha

A certeza

De que tudo nunca passou

De um sonho incoerente

Por tempo demais estive encarcerado

Numa jaula que eu mesmo construí

E por obra minha eu a declaro

Uma obra indestrutível

Diferentemente de qualquer poema

Ou de qualquer conto ou romance

Essa jaula será imortal

Com seu assoalho banhado a sangue

E suor

Essa jaula não se desfará em pó

Ou ficará para sempre em armários

Escuros

Pouco a pouco

Enquanto tempo me libera

Minhas memórias se esvaem

E para onde tudo isto irá

Eu absolutamente não sei

Se ao menos eu nunca serei imortal

Já posso me alegrar de ter construído

Algo desta natureza

O inferno que ronda meu coração

Que suga minhas vontades como

Um amor desvairado

Que edifica uma série incompreensível

De eventos destrutivos

Dilacera o coração, dilacera a alma

Dilacera a vontade

Dilacera o filho de deus

Que se um dia tivesse a luz em suas mãos

Dilaceraria seu pai

Um dia nada serei além de pó

E meus sonhos

Nada além de uma mancha

Esquecida e meio apagada

Marcada com rabiscos de criança

Na parede da eternidade