In memoriam [?]
1.
A memória
não é o forte
num sítio
que desconhece
o outro
e que perdera
a História
para sempre
na triste metáfora
ígnea
do descaso
2.
A angústia no presente
par
sem estar
a par,
a revolta no atraso
com as fantasias
do discurso
e o esquecimento
por hábito
instantes
após
a ciranda
das ilusões
e a leitura
anti-horária
da cultura
manchada
de lama
abaixo
dos nossos pés
3.
Flores não nascem
das cinzas
nem da plumagem
do falso encanto
inda que o adubo
seja
o fóssil
de algum anjo
sem certidão
de nascimento;
também as flores
não nascem do luto
temporário
dos que
lamentaram
o apagar
das nossas origens
sob os céus
d'uma América
Latina
completamente
devastada:
aquele símbolo
caótico
representando
a nossa Política,
as nossas Escolhas
e possivelmente
o próprio Futuro
que chegará
arrombando
as nossas portas
e os nossos sonhos
escassos
4.
Mas se esquece
do discernimento
quando se é
cativado
na retórica
da fragrância:
como pode
a necessidade de um povo
ser usada
indiferentemente
na
demagogia?
5.
Mas se esquece
para não abrigar
a dor
de se lembrar
que a culpa
não é
singular,
mas coletiva:
os anzóis
eram Deles,
mas as bocas
para o questionamento,
Nossas
6.
E não houveram
marchas
e não houveram
pressões populares;
apenas lágrimas,
lamentos,
despedidas
e depois
este Silêncio
enquanto
mais uma vez,
o Esquecimento,
nos abraçava
7.
Hábito confuso
e insensível da sociedade
dividida:
valorizar
o que se perde
quando o perdido
torna-se irrecuperável
*
*
O agora
se tornara vago
e descartável
diante
da nossa
ilusão
de eternidade
8.
A memória é um pássaro
que carrega
muitos dias
e muitas noites
e que sangra
e que sobrevoa
as nossas cabeças
feito um claro relâmpago
que dura
segundos
antes de
desaparecer
para sempre
*
*
*
E da mesma forma
que nenhum claro
relâmpago
é igual
ao próximo,
nenhuma Memória
posterior
será
semelhante
à anterior,
exceto,
é claro,
em tua possibilidade
de desaparecer
*
*
*
Os desencantos
se aproximam
de todos nós
e os encantos
são destruídos
por todos
nós