A Travessia

A humanidade vinha tocando a vida desapercebida

Na pulsação do seu ritmo um frenesi incontrolável, descompassado

Os sentimentos de cada ser conjugam o verbo em um mesmo querer

Ter, consumir, usufruir, deixar para trás os restos e seguir

Os olhos já não brilham mais contemplando o colorido da natureza

Estão enfeitiçados com a cor do papel da moeda impressa

Os sentimentos mais nobres se inverteram com o tempo

O amor deu lugar ao ódio

A benevolência foi violentada pela ganância

A delicadeza do carinho agora são marcas escuras na pele

A traição é uma valorizada moeda de troca, cantada em prosa e verso

A riqueza das letras, hoje são pobres variações sobre o mesmo tema

A elegância do bailar transformou-se em um vulgar passo de dança

Senta, senta, senta e já se pode sepultar, morreu a decência!

E nessa onda entorpecida a humanidade caminha sem saber que já foi vencida

Mesmo lendo e relendo os recados do Pai zangado

O gelo quebrando e as ondas subindo – invadindo!

O vento girando e destruindo – esvaindo!

O fogo queimando e o carbono subindo – reagindo!

O plástico enrolado no animal – sucumbindo!

Chega! Já não há mais poesia

E então o Pai onipotente enviou a praga que nos curaria

Invisível se espalhou rapidamente entre nós e nos fez olhar para cima

Para pedir em oração que nos dê sabedoria

Para entender que só o amor verdadeiro será capaz de orientar o caminho

Para que essa humanidade pecadora e vazia realize a travessia