SEM FRONTEIRAS

Massacrada, queimada, retalhada, silenciada

Com o corpo cansado e as mãos calejadas

Ela é mãe pobre que vai à luta

É preta, é linda, é índia, é mulher

É planeta, é floresta, gira porque quer

Chora porque precisa

E sonha porque também é filha de Deus

Deixa, por ilusão, o homem pensar que é dono

Quiseram até catequizá-la

Mas ela é muito natureza

Pra ser posse

Sideral e sedutora

Só faz o que quer

Mas tem memória, não abusa!

Tantas guerras por um palmo dela

Quantas mortes pra chamá-la de sua

E ela olha triste

Mas segue girando

Como se a cada giro

Uma criança possa nascer

E escrever uma nova história.

Ela gira porque não desiste

Sei lá se é brasileira

Mas sua gravidade é a esperança

Já foi verde, hoje é cinza

Azul de cima e sangra por dentro

Apesar de tanta injustiça e covardia

Seu oxigênio não acaba

Nem perde o pique da girada

Aqui é noite, lá é dia

A gente dorme, acorda,

e ela com a mesma energia

Já a decretaram plana, parada...

Quente a cada dia mais, sim

Quieta? Qual nada!

Ela segue girando

Ainda que tão maltratada

Gira porque não é quadrada

E sempre com a mesma elegância

Volta e meia, olha pra dentro

Mesmo àquela distância

Vê tanta tirania e ganância

Mas, ainda assim, segue girando...