Quem já foste?

Tu já foste o fulgor calmo da aurora?

Já colhestes bondade de tanta aridez?

Consegues rir e chorar de tua estupidez?

Tu já foste fonemas e verbos de poesia?

Já esqueceste de ser piedosamente feliz

Para fazer brotar (em teu amigo) alegria?

Tu já foste aquela antiga e terna canção?

Já ficaste verdadeiramente venturoso

Por alguém estar rindo e saudoso?

Mesmo sendo um riso vazio na tua solidão?

Já choraste ao ver o silêncio do pássaro a morrer?

Ou ficaste com o teu olhar olhando alguns retratos

Quando compreendeste que teu bruto entardecer

Futuro será engolido pela voracidade do passado?

Já sofreste pelos que sofrem,

Nas beiradas das lápides

(tão tristes, tão eternas)

Nos leitos dos que tanto morrem??

Já pensaste que enquanto lês

Há alguém se suicidando?

E as lágrimas choram sozinhas

Quando tu estás velando e amando...

Já foste copo cheio de água e alento

para a sede de quem tu amas?!?

Já tentaste acariciar a tristeza do vento

Enquanto o amor alheio brilhava em chamas?!

Tu já foste os frutos pisados

pelos pés de quem te era leal?

Mas o lírio do perdão foi abandonado

Na beira daquele rio cheio de dor ancestral.

Tu já foste para ti mesmo alegria?

Então, por que toda essa correria?

Por que há os barcos dessas alegorias

Que navegam tão sinuosamente

Sob os ventos das cotidianas ventanias?

Então, apalpa sem medo teu irreal rosto,

Tu consegues ver-te quem foste e quem és?

Alguém pranteou o teu espírito deposto

quando teu sol caiu naquele icônico revés?!

(Gilliard Alves Rodrigues)

Gilliard Alves
Enviado por Gilliard Alves em 01/12/2020
Reeditado em 02/12/2020
Código do texto: T7125143
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