A alva barca

Entre a névoa translúcida

E a areia deveras molhada

Nascia, calada, uma barca.

E o Mistério emergia e flutuava.

Era a semente da barca da alva,

Antes do machado ferindo as árvores,

Dentro da ideia da árvore e dos pássaros,

Ainda havia o cheiro de pétalas na água

(Sob a voz do vento que corria sem mágoas.)

Entre tantas margens áridas,

Como sobre ocultas lágrimas,

Era uma simples barca mágica

Em marcha frenética da fábula,

E o Mistério vagava na névoa pálida.

De dentro das novas igrejas e casas

Silenciosas, misteriosas e fechadas,

Quem viu a fluidez dessa barca

Entre as névoas da água alva?

E o Mistério rugia das ondas plácidas.

Sem o peso dos remorsos,

Livre como o voo das águias,

Sem remos nem máscaras,

Segue a barca sem máculas,

E o Mistério atravessa básculas.

Adeus para as antigas árvores,

Adeus aos amigos e aos pássaros,

Seguindo o rumor das tristes águas,

Levadas pelo hálito da brisa, rápida,

Sob o Mistério insano da barca grávida.

Sozinha passava a alva barca,

Poderosa, sem volta, e calma.

Sem qualquer expressa palavra,

Cada ida [e a ideia da "ida"] passa,

(sem cais certo, sem pausa...)

Era a sonhadora e definitiva barca da alva!

E que porto ou ancoradouro nos aguarda?

Gilliard Alves
Enviado por Gilliard Alves em 08/07/2023
Reeditado em 09/07/2023
Código do texto: T7832397
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