Simplicidade

Lembro me de sentar na varanda da casa do meu avô, uma luz branda e o frescor da noite em meu rosto, olhando para o nada e para tudo que meus olhos não conseguem enxergar, consigo ouvir o coachar dos sapos, o canto das cigarras, o baile dos vagalumes, o brilho das estrelas, e sem uma palavra nos percebemos ali, juntos, sendo preenchidos pela beleza e plenitude da natureza.

Lembro de brincar na rua, pés descalços, mente vazia, levando só o necessário para viver aquela alegria.

Lembro de tomar banho de rio, comer fruta no pé, pegar coco no curral direto do cocô da vaca e ir correndo para o córrego lavar, quebrar com uma pedra e comer sua castanha, sempre acompanhada de quem importava.

Lembro de sentar ao lado das pessoas que amo e me sentir inteira mesmo sem ter um tostão na carteira.

Lembro de ver a alegria de uma criança ao descobrir pela primeira vez uma poça d’agua, um giz de cera, uma bolha de sabão.

Lembro da emoção de toda uma família que, depois de dias incríveis juntos, acampados no meio do mato, fazendo fogueira para se aquecer, lavando a louça no rio e cantando para espantar o frio, tem que se separar e que nunca mais se uniu com tanta paz.

Lembro que de todas as lembranças que tenho, as que permanecem e nunca se desvanecerão são das alegrias proporcionadas pelas coisas mais simples vivenciadas.

Lembro do sentir sem querer entender, do estar com todo o meu ser, do esquecer de tantas coisas que eu mesma criei para meu viver e que sugam minhas energias me impedindo de ver o que está, sempre esteve, diante de mim mesma.

Queremos tanto, nos preocupamos tanto e no fim das contas o que nos resta são as lembranças do quanto fomos felizes justamente naqueles momentos em que menos tínhamos e menos nos preocupamos em ter.

A simplicidade de uma criança que se entrete por horas com uma simples bolha de sabão e que por não ter noção do quão complexa é a vida, vive o que tem no coração; do animal que se perde correndo atrás de seu próprio rabo sem se preocupar em estar fazendo algo de errado; do ancião que não tem mais a preocupação de agradar e que sendo quem ele é nos mostra quanto tempo perdemos fazendo o que o outro quer; da natureza que vive em sinergia, sem tomar nada de ninguém ou querer ter mais do que precisa e que assim cumpre sua missão sem a preocupação de que um dia não mais existirá, pois sabe que em sua simplicidade encontrou a eternidade em si mesma e em tudo que dela provém.

Ser simples no viver, no sentir, no pensar, no enxergar o que a vida nos dá, acredito que esse seja o segredo do bem estar e o único caminho para se sentir inteiro mesmo se fazendo em pedaços para viver tudo o que nos dispomos a ser.