NUDEZ

Há entre mim e mim mesmo
um espaço intermitente,
transcendente,
que me cala num abismo, inconsistente
sobre o nada.

Há uma solidão conveniente, necessária,
que me faz uma higiene sumária
do que o meu corpo excede e a minha alma ressente,
incandescente,
à luz difusa na imagem espelhada,
na noite silenciosa e orvalhada.

Há um não-sei-quê vago e disperso
no ar, que se expande no universo
e paira no meu corpo a me abrasar;
vibrante, erétil, num desejo imerso.

Há uma clara lua que se fez
pra refletir-me a máscula nudez,
expondo-me a lira abdominal
na palpitante região dorsal,
que se tateia ao vértice da espádua
onde uma onda de suor deságua.

Há uma amálgama ânsia
em reentrância
a mexer comigo,
a me tremer do lábio à região do umbigo
num frêmito de espasmo lancinante,
lívido e lascivo no peito pulsante.

E ao ver-me assim frente ao espelho
persigno-me, quase de joelho,
num ritual erótico: mais ou menos
como se Eros contemplasse Vênus.

Translúcida nudez me lembra Ártemis,
irmã de Apolo, que, elevando o pênis,
narcisamente vê-se em deslumbrante
misto: paraíso e inferno de Dante,
a confundir-se com este poeta amante.


LordHermilioWerther
Enviado por LordHermilioWerther em 21/09/2008
Reeditado em 28/02/2012
Código do texto: T1189489
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