DA JANELA DOS MEUS OLHOS

DA JANELA DOS MEUS OLHOS

Da janela dos meus olhos vejo o mundo inaceitável para muitos.

São imagens que se formam de dentro de mim.

Da janela dos meus olhos nasce o meu amor e dessa mesma janela vejo tudo de lá.

São imagens que nascem devagar, vão nascendo lá da janela dos meus olhos.

Dos meus olhos também nasce uma brecha.

Ás vezes fico encurralado por que, preso, olho só pela brecha, pela brecha dos meus olhos.

Quando uma música paira no ar, abro a janela, mas só uma brechinha esta lá.

Da janela dos meus olhos avista-se um filme. Uma película.

A poeticidade da imagem que se forma diante da porta de entrada

da cristalina sensação de ver o que não tenho.

Da janela dos meus olhos vejo o límpido amor fraterno, o amor que não tive,

alguém que não conheci, alguém que se foi, que não me levou.

Todos ficam na janela me olhando, e eu, da janela dos olhos, olhando também.

Da janela dos meus olhos, olham todos também. De repente uma imagem:

O sol queimando ilumina intensamente o ar da brisa, o calor que secou as folhas,

as folhas que se ajeitam do seu jeito, do jeito que a imagem quer. Assim é da janela dos meus olhos.

Da porta vejo a janela. Meus olhos são vitais para que se estabeleça uma conexão, uma sintonia fina, como o vidro que reveste, às vezes opaco a janela dos meus olhos. Eu vejo. Tudo eu vejo. Eu vejo você. E chove muito lá fora. Chove intensamente, mas só da janela dos meus olhos. Alguém me chama. As imagens me chamam. Adoro repetição.

Da janela dos meus olhos passão coisas, passão sonhos, passa gente; gente que fica, gente que vai, gente que volta, gente que não volta mais. Mas passa gente que já foi. Também da janela dos meus olhos gente que ainda vai chegar. Passam imagens inimagináveis, imagens do imaginário, imagens que não quero; imagens sem ritmo, imagens das imagens já passadas.

Da janela dos meus olhos imagens de sonhos confusos. Do vidro embaçado vejo tudo, vejo todos os desejos, vejo as outras pessoas; vejo a destruição, as construções. Vejo quem nasce, quem vai nascer; vejo quem já foi.

Da janela dos meus olhos vejo o movimento acelerado das coisas acontecendo. Dificuldades, choros, pedidos de socorro. Vejo beijos de emoção, vejo imagens de pessoas saindo de perto de mim; saindo de casa, do país... Vejo também saindo no inverno ou queimando na árdua quentura na terra rachada de fome. Da janela dos meus olhos, é assim que vejo a janela dos meus olhos.

EMERSON MENDES