Quinhentos anos de solidão
Não tenho dormido bem a noite
O que está acontecendo no mundo
Me assola
O que está acontecendo no país
Me devora
É difícil dormi com tantos demônios
Me assombrando
Com tantos parasitas
Me sugando.
E o que posso eu fazer
Se sou apenas um
E apenas maior que nada
Essa virose crônica
Não pode ser curada
Com antibióticos.
Queria que fosse a peste da insônia
Mas apenas alguns outros
Estão contaminados
O resto ainda dorme
Como uma alma imaculada.
Ouvi falar de um mito
Que assim como o anti-cristo
Vem com promessas de salvação
E de um antigo herói
Que com quatro dedos numa mão
Ainda quer empunhar a espada
E trazer para todos a redenção.
Mas não importa o lado que olho
Vejo sempre a morte pelada
Pronta para nos fuder.
Na verdade não existe um rei
De alma lustrosa como ouro
Digno de remover a espada encantada
A muito tempo na pedra fincada.
Mas tem alguns filhos perdidos
Do coronel Aureliano Buendia
Tentando trazerem mudanças em pró
Dos seus próprios benefícios.
Como pode a solidão de um país inteiro
Ser muito maior que a minha
Até o meu grito, ecoa mais alto
Do que o grito que deram
Mas já padeceu.
E já não mais esquartejam dentistas
Mesmo assim não há um dom Pedro primeiro
Para gritar independência ou morte
E já não mais é uma linhagem de sangue
O poder agora está entregue nas nossas mãos
Mas não há um Deodoro da Fonseca
Para proclamar nossa república.
Mas tem alguns pensadores de botiquins
Que mal estão sóbrios da real situação
E que vêem no livro, que quase ninguém leu
Um achado para sairmos
Da caverna de Platão.
E um manifesto pode ser escrito
Cheio de palavras: de ódio, rancor, lamúria e utopias;
Podem citar até o livro, que quase ninguém leu
Mas nenhum discurso de rei
É tão inspirador para vencermos a guerra.
Pois até os reis estão entretidos
Em nos iludir a seguir o caminho para as índias
Mas o que eles querem é que nos percamos no meio
Para que eles se apossem dessa terra
Cheia de riquezas a serem exploradas.