terno cinza-escuro

“hoje sou folha morta

que a corrente transporta”*

ando na beira do riacho

agora pra ver se me acho

no intenso brilho da água

que como o do trilho me acalma

quando na beira da estrada

eu fico à espera do trem

com meu terno cinza-escuro

pareço-me com o futuro

que exibo com ostentação

tendo a feliz sensação

de que ainda vou colorir

o céu da maneira que quis

pois é, não me sinto infeliz

mas é que o pincel que procuro

não acho no quarto escuro

que hoje a mim reservaram

e mesmo se um dia o achasse

não sei se o que quer que pintasse

seria algo bom de se ver

chego até a temer

o modo como realizo

as coisas que ainda consigo

como parar na beirada

e ver a água correr

Rio, 16/08/2007

*versos de Ataulpho Alves, em "Fim de Comédia"