Quisera fossem lidas

Rola em meus dedos, sai pelos poros,
salta dos meus dedos, cala na boca
a saudade que aflora louca,
de algures idos na maré esquecida,
que não fez a viagem prometida.
Falam os versos no calor da pele,
na lágrima que mergulha
umedecendo os lábios cerrados,
na espreita da bagagem arrumada,
expectativa da chama, da fagulha,
de um toque de esperança.
A dose de guarda nas noites vazias,
enquanto lá fora ela descia,
molhava a calçada.
Era garoa com vontade de chuva,
com gosto de lágrima,
sabor de prece.
Oração que quase parece
um grito companheiro.
Um abraço que se abre
quando, de manso, a solidão chega.
E mais e mais as folhas preenchidas
saem ao abandono.
Nada se vê,
além do silêncio que canta a noite,
na brisa leve de você,
no perfume que deixou,
no amor que antes levara
ao cume das nuvens.
Rogo a Deus o fiel pedido da fé
na colagem eterna das epidermes,
a troca deliciosa de nossos germes.
Agora, silenciosos sons de penas
tintam a saudade no papel,
tingem o vazio de negro
numa tela sombria, nefasta,
no lúgubre sentido de se ser só.