Cabernet?

Cabernet?

Delasnieve Daspet

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Quem sou?

Qual a minha função?

Espero o tempo acabar

Terminar o expediente.

Fechar o livro ou o computador.

Em casa, me aguarda,

Uma taça de bom cabernet,

Tinto, seco, denso, em taça redonda e alta.

Um gole. Sabor balanceado, suave, frutado,

Enquanto ajeito a cama,

Tiro o pó. Limpo tudo.

Esperando o amanhã.

Assim é.

O que sou? Um vaso, dois vasos,

Uma coluna ou duas.

Já nem sei se sou Caim ou Abel.

Mas já fui Marilia de Dirceu.

Já chorei com Eurídice e Orfeu.

Não sei se sou mais ou permaneço menos.

Amordaçada, não sossego.

Apartheid, não me entrego.

Meu corpo frágil se agita

Na ausência de vida,

Sou tudo. Sou nada.

Sou pó.

02.09.21