Dona Maria da tapioca
Na frígida noite caruaruense
Com vista à praça da prefeitura
Uma senhora de vários anos trabalhara
Na esquina da farmácia, semblante repleto de ternura
Lenço branco e avental,
cabelos pintados pela cor do tempo
Mãos calejadas coziam massa tradicional
Decerto aquilo lhe servia de passatempo
Ao descer do ônibus, a cena logo me atraiu
Como pode alguém de tanta idade
Superar suas próprias adversidades
E servir deliciosa tapioca, confesso-lhe a verdade
De início, evitou conversa
“Aliás por que a você meu trabalho interessa?”
Passaram-se noites e conversamos a beça
Voltei outras vezes, ajudei com o calço do banco
Noutras até as brasas do fogo fui abanando
Contou sua história sofrida, serenamente suspirando:
“Vou morrer vendendo tapioca, faço isso há anos”
Nos tornamos amigos e a fazia companhia
Enquanto confabulávamos, eu varria o chão
Deixei-me levar pela minha mania
De não aguentar ver solidão
Já faz uns dias que por lá transito
E sinto falta do estalido
Do carvão quente no fogão
Espero que algum dia
quem sabe, em diversa esquina da vida
Eu possa comer daquela comida
Tão macia, feita com alegria
Pelas mãos de Dona Maria.