O TRABALHO E O LAZER
 
Minha formiga estava achando ruim
A forma como vivia dentro de mim,
Por isso resolveu procurar trabalho;
Estava louca para deixar o borralho
Pôs uma gravata e vestiu um terno,
Foi procurar comida para o inverno.
 
Porém a cigarra que vivia em mim,
Gostava muito de ser e viver assim,
E sem desejo de mudar ou crescer,
Em meu coração ela foi se esconder.
Ali passou todo o inverno á espera,
De que viesse de novo a primavera.
 
Ela esperava que a formiga voltasse
Trazendo a comida que encontrasse    
Para cumprir uma promessa que fiz,
Que um dia seríamos um casal feliz;
A cigarra, cantando as suas canções,
E a formiga cuidando das provisões.
 
Pois a felicidade então me parecia,
Uma vida com segurança e alegria,
Em que se pudesse comer e cantar.

E se ambos eu conseguisse ganhar 
Poderíamos gozar a nossa felicidade
Vivendo entre o sonho e a realidade.
 
Mas o mundo sempre nos modifica
E quem vai se esquece de quem fica.
Se para a cigarra, a formiga era fútil,
Para 
a formiga, a cigarra era a inútil,
Já que a primeira só vivia cantando,
 Mas a segunda somente trabalhando. 
 
Assim fiquei em meio á uma guerra:
O feroz conflito entre o céu e a terra;
Pois se a cigarra alegra meu coração
É a formiga quem me fornece o pão.
Elas vivem em minha mente a brigar
E não sei a qual delas razão devo dar.
 
É a formiga que me comanda de dia,
E não me permite nenhuma fantasia;
Porém à noite, a cigarra toma conta,
E toda a minha seriedade desmonta;
E se de dia eu só ando em linha reta,
Viro a noite como um bêbado poeta.
 
Estava difícil sobreviver dessa forma
Fatiado entre a liberdade e a norma,
O sonho de ser e a ansiedade de ter,
A necessidade rude e o doce prazer,
Dividindo a vida numa eterna briga, 
De alma cigarra num corpo formiga.
 
 E foi em face deste conflito imenso
 Que acabei encontrando o consenso
   Entre o meu adulto e minha criança;
   A nenhuma delas eu dei  a liderança
   Porque que de ambas muito preciso
     Pois uma é o prazer e a outra o juízo.
 
  Cheguei assim à inaudita conclusão,
 Que alma é lazer, corpo é profissão;
 Deus os fez mutuamente inclusivos
  Para que possamos continuar vivos.
   De dia é pegar no batente com garra
   Para, à noite, poder sair para a farra.
 
   E é assim que aprendi a levar a vida,
   Dividindo-me entre o prazer e a lida.
   Nenhum deles reclama mais de mim
    Se de dia sou yang, de noite sou yyn.
   Porque, para que tudo possa vir a ser,
   Só equilíbrando o trabalho com lazer.