TrÊs
I.
todas essas semanas
e o bloqueio criativo ali,
na pontas dos meus pés
me impedindo de caminhar
sem a presença de uma terceira perna
saco o isqueiro do bolso,
acendo a terceira perna,
fumo a terceira perna,
que vira cinza.
(ela renasce).
os olhares deixaram de ser acidentais.
aceito que tenho três, quatro, cinco, oito pernas
sou uma aranha com uma perna a mais a cada dia
ando desajeitamento, mas aprendi
a caminhar com elas
quando mais ando,
mais as pernas se desgastam
e vou perdendo o equilíbrio
até que todas elas se dissolvem
e só me restam duas, (comum a maioria dos humanos)
agora devo reaprender andar sobre elas.
II.
já com a forma humana recuperada,
tento lembrar como funciona o caminhar.
tento fazer o caminho inverso.
tento olhar o avesso.
me fecho por dentro,
me fecho em mim mesma.
(há uma única fresta de luz que entra pelo canto de meu olho esquerdo).
III.
questiono-me se a terceira parte
deve ser sempre sobre o fim.
questiono-me se sequer dever haver
uma terceira parte
ou se ela é apenas um apoio,
uma bengala, descartável
como a terceira perna.