ÚLTIMA VISITA

A morte veio cobrar a fatura.

Era meia-noite, meia-noite escura,

desceu ela de sua carruagem em frangalhos,

seu boneco de ventríloquo era um espantalho,

na mão esquerda a lança de ponta fina,

seus cabelos desgrenhados com parafina,

desceu cambaleante e coxa,

oxalá fosse uma pessoa outra,

riu sem som, só o bafo mortal,

tudo fora de tom, meio gutural,

deslizou, chegou bem perto,

numa análise visual, de certo,

apalpou, esfregou, alisou,

um bom tempo demorou,

abriu os lábios, dentes podres,

queria meu sangue em seu odre,

encetou cantar uma canção triunfal,

era um som gasoso, sideral,

chegou perto do ouvido

e falou aos meus sentidos:

vem, mortal comum, hoje é o dia

de viver em lugar algum, sem poesia...