CHICOTE

Era um dia de chuva densa,

ardia na pele a friagem cortante!

O vento espalhava sua fúria aquosa,

fúria que alagava a avenida imensa!

Desciam num fluxo intenso e constante

os fios massivos daquela chuva grossa!

Na calçada um menino franzino, com gripe,

engraxava com zelo sapatos caros, de grife,

com seus pés descalços, sujos de lama:

lama do chão imundo!

Com sua alma sofrida, suja de lama:

lama da frieza do mundo!

Notei que o menino espirrava

enquanto exercia seu ofício,

e pensei com Deus: que vida difícil,

na sua idade eu só estudava!

Recordei a minha infância,

e vi um menino asseado sentado à mesa

da sala de aula de um renomado colégio!

Vislumbrei o destino daquela criança

no corpo de um homem maduro,

e para minha amarga surpresa

percebi que o tempo que dediquei ao estudo,

este passaporte para o futuro,

foi, na manhã da minha vida, um privilégio,

porque não precisei trabalhar, tive de tudo!

Antes de me deitar, olhei para o retrato

da minha mãe, que foi uma mulher forte,

e pensei com ela no silêncio do quarto:

mãe, como é frio esse chicote!

Carlos Henrique Pereira Maia
Enviado por Carlos Henrique Pereira Maia em 24/01/2022
Código do texto: T7435995
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