O farol.

Deslizam os navios, vindos longemente

Em lentidão desesperada, buscas

A costa nua igual água, tudo prata luado

Coisa só, a escuridão e a mente

O mundo perolado em negrume

E mil marinheiros gritando os silêncios

Sabendo os assobios da brisa, suave nauta

é quem guia os incautos dormentes — sonâmbulos

—, uma única chamada e se acende a torre:

eis o farol, redondante, deusando, olho em tudo,

faca a cortar a cabeleira negra; e todos em fascínio,

cada rosto alcançado, cada corpo em graça,

imediatices, vida, de certo, impercebida:

luz que vem e vai, morrendo e virando deus.

E todas as formiguinhas se voltaram para lá.

Mar é o vazio mais cheio de si; e os navios

desataram os fios da branda eternidade.

O mesmo que assobiou foi aquele que pulou,

desertor da insanidade, defunto movente,

deixou-se levar pelas ninfas do mar.

Enquanto todos partiam disparatados

A luz, em giro cada vez mais único, fazia dia

em noite apocalíptica. Vento que vem,

gente que sente, suor que escorre,

chuva perene. Explodiu-se a torre

e a erupção espalhou brilho e pedras

que atingiram todos os próximos.

O mar vermelho, os gritos de quem morre,

e o canto daquele quem sabe:

reflexo é lá, o que há é aqui;

quem vai em prol do farol

saberá ir às vias do Sol?

Rodrigo Hontojita
Enviado por Rodrigo Hontojita em 14/03/2024
Reeditado em 16/03/2024
Código do texto: T8019936
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