Violências veladas

Aquela voz da minha cabeça

Não quer sair,

Fica me dizendo

Que nada tenho aqui,

Que à rua irá me jogar,

Que meu destino será mendigar.

Não venha me dizer

Que ficar com os filhos

Não é profissão,

Se isso no passado

A mim foi uma imposição,

Boba eu imaginava

Ser uma combinação.

Não entendia que essa proibição

É o tipo mais comum de agressão

E que já sofria desde então.

Fui criada para mãe,

Esposa me tornar,

Para com meu marido

Velhinha ficar,

Sempre obediente

Para a família preservar.

Exigiu que eu deixasse o emprego,

Dizia ter medo de chifre levar,

Me isolei do mundo só para te agradar,

Aprisionada à casa, estive a ficar

E assim nem vi os anos passar.

Filhos criados, já bem encaminhados

Resolvi voltar a estudar,

Mais uma vez, tentou me anular

Queria muito poder me formar.

Outra guerra começava,

Você de tudo me chamava,

Vencido pelos filhos

Que me incentivam.

Período difícil de aguentar.

Quando não me buscava

À espreita sempre estava

Procurava o que não havia

Finalmente, o Ensino Médio

Aos trancos e barrancos, eu concluía

Naquela época, não entendia

O que é agressão

Que viver sempre sobre pressão

Um dia vira medicação

Para um mal silencioso: a depressão.

Se me anulei pela família,

Se deixei o mercado de trabalho

Para os meus filhos educar,

Se antes não tinhas nada,

Se sacrifícios juntos fizemos na caminhada,

Como não tenho direitos

Se tanto me esforcei

Pela gente nesta empreitada.

Insultos, injúrias, ameaças

Eu pensava ser fruto de cachaça

E assim, mais uma vez

Eu te perdoava.

Mas o ciclo da violência nunca termina,

É uma gradação, uma escalada

Deixamos passar a primeira

Ignoramos a segunda

Desacreditamos tantas outras que se seguem

Só compreendemos quando a agressão física

Demora mas aparece.

Cheeeeega! É hora de dizer não!

Tantos anos, tantas formas de agressão

Que me adoeceram,

Hoje para dar um fim,

Sozinha não consigo,

Preciso de carinho e atenção.

Basta de viver essa violência velada,

De ter a voz silenciada,

Para parecer a família idealizada.

Me empreste a tua mão,

Cansei de medo sentir

Me ajude a conseguir

Em direção à delegacia

Devo seguir,

Aquele madito precisa saber,

Que dele vou me defender,

Que o ciclo de violências

Vou interromper

Porque eu quero viver

E quem sabe um dia feliz

Ainda possa ser.

Mari Velasco
Enviado por Mari Velasco em 05/09/2022
Código do texto: T7598808
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