Simbologias
Meu avô era paz
Calmaria e assovio
Minha avó benzedeira
E muito rezadeira
Nasci em domingo chuvoso
Em tempo de lua cheia
E dessa mistura o feitiço
Sou bruxa verdadeira
O outro avô era repentista
Piadista e contador de historias
A outra avó maternal
Cozinhando emoções
Pés no chão a firmar o prumo
Da curvatura na coluna
Nasci meio torta
Mole e meio avoada
Minha mãe é guerreira
Brava e batalhadora
Mulher que mata a cobra
Rato, sapo, galinha, porco e lagarto
E se bobear até gente com os gritos que dava
Meu pai era teimosia e valentia
Paz e mansidão
Silêncio e serenidade
E dos elos da contradição
Nasce um ser de pura bifurcação
Chega num dia 13,
Número
da sorte
e da morte
De tudo aquilo que precisa morrer
Para um ser nascer
Nasce morta e de forma violenta
Em ferrolho que a sua pequena forma atormenta
Sufocada
Arroxeada
Chora e nada pra vida
Nas águas de março
Em hora incomum
Visto que te abandonaram
Com seu bem estar não importaram
E chegas quase como gata borralheira
Ou loba mulher
Na hora derradeira
Corta se enfim o cordão
Ruptura
E te pegam na mão
Nasce depois da hora
Sabendo que toda hora
É hora de chegar
E também de partir
Nasce morrendo
E sofrendo
Desengasga e grita
No sopro da vida
Que morre e nasce
um pouco a cada dia
No mundo todo seu
Desde o dia que nasceu
Ana Lu Portes, 28 de setembro 2023