CIDADANIA(?)
CIDADANIA (?)
O sêmen da pressa dança no útero urbano
Duma cidade que açoita os dorsos, com o frio das manhãs,
O coração das ruas pulsa com exasperação
Para que as pessoas possam se resvalar em seios de pedra.
Os homens e as mulheres bailam no ventre urbano,
Engravidando o PIB das nações,
Enquanto o suor evapora-se no asfalto.
As pessoas cumprem seus deveres, às duras penas:
Amanhecem nos quintais junto aos refluxos do relógio,
As pessoas adoecem, ainda assim, tecem o dia-a-dia,
Rezando a saúde dum futuro incógnito.
No entanto, eis a serpente humana nas fileiras da espera,
Eis os enfermos nutrindo seus males na contingência dos leitos,
Eis os Professores atônitos e alunos ausentes em si mesmos.
Os lobos públicos vestem a fina lã das ovelhas
Enquanto aspiram cadeiras de gabinete,
Mas seus dentes de sabre rasgam a carne
Das pessoas de bem e depois arrotam seus votos.
Os que esculpem essa metrópole com argamassa e sangue
Afagam os impostos como cacho de espinhos
Para depois beberem a lágrima compulsiva das cidades.
Fundem-se num só corpo mestiço,
Contorcidos na teia repleta de excessos
E se olham e se falam e se calam
Diante da indignação que excede os sonhos.
As pessoas são sangue, vias são veias,
Os traçados do asfalto desenham os esqueletos sinuosos,
A lua da cidade é ave noturna anônima no vôo.
O direito dos homens está de plantão no bocejo da noite,
O dever está atado em mãos farpadas da injustiça,
Por isso os galos invisíveis solfejam no alvorecer,
A cidadania agonizada no sofisma de seus governantes.