CENTRAL DO BRASIL
A Central do Brasil passa em Lorena.
Estrada de Ferro que corre por trás do meu quintal;
estremece o muro e a casa, sacode-me as ideias...
O trem chega engolindo a calma da aprazível Vila Geny, quando vem do Rio;
vindo de São Paulo, a primeira vítima é o bairro São Roque.
Velha Estrada que pertence a RFFESA.
Por ela passa de dia
e também passa de noite
passa passa passa passa
lá passa chapa de zinco
esquadria de alumínio
de ferro, rolo de fio
matéria que vira carro;
passa cimento e barro
seixo asfalto madeira
material reciclável
passa lixo, ferro velho
também produto inflamável;
de tudo passa com força
no lombo dessas lombrigas,
vai grão gorgulho formigas
plástico, bolo de entulho
passa ferrugem barulho
principalmente barulho
que quase me rasga os tímpanos.
Um ponto de encontro, isto é, de desencontro dos trens,
coincidentemente, fica atrás da casa 511, da rua Joaquim Cardoso Machado, na Vila Geny.
Prazerosamente moro nesse endereço, de onde vejo por sobre o muro do quintal
correrem as intermináveis serpentes...
Peço a Deus que não parem; Ele raramente me atende.
Suspiro e meio, uma delas está lá, à espera da que vem em sentido oposto.
zum zum zum zum zum zum zum zum zum zum zum zum...
Chega uma e fica ali, mastigando combustível até outra surgir, meia hora, cinquenta minutos depois.
Suspiro e meio é exagero?
Ocorre de madrugada
seis oito nove dez horas
entre zum zum e pancada
meio-dia treze, bolas!
a sesta é descontrolada;
dezesseis e dezessete
dezoito vinte, no ar
burburinho no almoço
no repouso no jantar;
vinte e duas meia-noite
tento, não dá pra dormir
a cabeça a zunir
mulher meninos marido
na cama em sobressalto;
de paciência estou falto
em meu ninho sou mordido,
coitado do meu ouvido
progresso tem preço alto:
custo ainda não avaliado...
Dane-se meu ouvido e outros mais!