Empresta-me o teu sorriso

Empresta-me o teu sorriso vitorioso

E não mais chorarei dos infortúnios do mundo

Regozijar-me-ei das vestes finas

Dos pratos fartos, dos palácios a ti construídos

Não mais estenderei mãos aos que clamam...

Empresta-me o teu sorriso sarcástico de indiferença

Diante do destino malfadado de quem,

de miséria em vida, sustenta teus luxos e benesses...

Assim compreenderei o que é subtrair mais de menos

e, ainda assim, sorrir como os justos e subtrair ainda mais...

Empresta-me o teu avassalador sorriso

Tantas vezes usado para negociar homens

Furtar-lhes condições mínimas de trabalho, saúde e estudo

Decidir o seu destino, estabelecer-lhes o ganho

limitar-lhes os anseios, reduzir-lhes a sobrevida...

Assim compreenderei as minúcias da tua hipocrisia

Estampadas nas tuas mil faces e mil promessas

Espalhadas com esperança nos muros dos crédulos e cegos por ti ofendidos...

Empresta-me tua indignidade, que saberei o que sentes do pedestal onde estás...

Compreenderei o que são os teus valores, as tuas verdades...

Sorrirei para meu país com a dissimulação de que te revestes...

Acomodar-me-ei pregando a falsa ideia de que a uns o céu em Terra, à maioria, o destino...

Darei às fragilizadas criaturas que tu dominas as migalhas, o mínimo à sobrevivência e sorrirei...

Sorrirei a falácia do egoísmo que retira do outro a possibilidade de ser digno

Darei a alguns a oportunidade de dizer que te conhecem

Sentar-me-ei à mesa dos humildes para parecer um deles

E continuar cativando os seus votos...

Sorrirei por ter tirado a liberdade de tantos

Pois não pode haver grilhões mais dolorosos

Do que não discernir no momento da escolha...

Sorrirei a indiferença aos dissabores de quem produz e nada pode colher...

Empresta-me o teu sorriso infernal

Pra que eu compreenda o que se passa em teu coração envidraçado

Pra que eu possa esquecer esta lágrima que agora me flui

E dilacera diante de tudo o que vejo nas ruas e nas estradas, todos os dias e que ainda me consome...

Talvez, com o teu sorriso tão convicto, eu possa dar-te razão.

Mas empresta-mo por apenas um minuto

Somente para ver se seco esta lágrima que me corrompe o olhar

Penso no próximo e exalto minha pequenice ante o poder de sedução Poder que de ti emana e aos outros engana...

Mas não te esqueças de buscá-lo em devolução...

Não o quero eternizado em meu rosto

Prefiro ouvir de todos que perdi o meu voto.

Nalva
Enviado por Nalva em 02/05/2006
Reeditado em 18/02/2014
Código do texto: T149221
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