Insônia: no país de mil e uma noites de espertezas

Noites de tormento,

Nenhum alento...

Deitar no silêncio do outono

Em uma terra de rei sem trono...

Ver as folhas que voam

E distantes caem e se amontoam...

Como os rebentos que nascem

E que ofegantes perecem...

Noites de cefaléias

Sem o perfume de bromélias...

Rolar a cabeça insisto

Ao sono desafiar o visto...

Das árvores que se imolam

Na correnteza do Amazonas rolam...

Como os sobreviventes no país

Da gente que insiste ser raiz...

E ter na fome e na miséria

Sua sina, de José a Quitéria...

E corar ante a corrupção deslavada

Não ver a cor da grana em paraísos fiscais lavada...

E diante da contumaz exploração

Indiferentes marcharem trôpegos sem ração...

Mas dos troncos ceifados

das matas e ventres, surgem arados...

Que vêm despertar a ira, inda que feito bando

Contra o império da desordem, dos desmandos...

E dizer chega desta mixórdia

De tanta insensatez e luxúria...

Estar no limite, de não mais suportar

Este constante estado de guerra silenciosa, abortar...

Deste consentido genocídio,

Deste infinito e indevassável latifúndio...

Acumular de um lado dores, rancores, bolores,

De outro desprezo, cobres, dólares...

Afinal, vivemos em um país cuja presteza

É se orgulhar de pagar a conta a sua alteza...

Insone, ter medo de dormir, ter pesadelos

Insônia, cegueira, surdez, sonhos, melhor não tê-los...

Pois, ao acordar, diante da realidade, com certezas de viver no país das mil e uma noites de incertezas (e espertezas)...

AjAraújo, poema protesto sobre a crônica corrupção em nosso país, escrito em 2001.