RODAMOINHO

Eu confesso a minha ignorância ao ter

que censurar o dia-a-dia alheio

sair de casa pra fazer rodeios

dar cambalhotas pra chegar no emprego

fazer regime pra ficar esbelto

correr na praia pra manter a forma

- É a gurizada cultivando o físico

e a mulherada costurando a pele.

Pago o alto preço de viver assim

nesta cidade moderninha e velha

toda furada, cheia de magia

se alguém se perde todo mundo é guia;

mas cada um leva no peito um grito

verdade surda, num semblante aflito

- A esperança de acertar em cheio

nos treze pontos e ser gente um dia.

Essa gente toda comprimindo os passos

olhando o chão e contemplando o espaço

deixando atrás a ilusão do rasto

enfileirada procurando um abraço.

Fazendo o pobre cada vez mais pobre

pagando ao forte seu viver mais alto.

- Vai confessando seu pecado aos dedos

sangrando pingos de contradição.

Leva na coleira seu animalzinho

encoleirada vai também seguindo

sem rumo certo, paradeiro ou pasto

ferindo o salto, derretendo o asfalto

farta de fome sem orgulho ou fama

necessitada do poder ser;

- Apedrejada no seu ganha-pão

rodamoinho, vai de mão em mão.

Urros e lamentos de contestação

de vez em quando faz soar ao longe

mas a voz rouca vai perdendo o brilho

e abafada na garganta oscila

chama a cegonha e recolhendo o “sêmen”

procura a luz trazendo ao mundo encanto

- Aumenta a fé na sordidez dos homens,

girando a roda vai seguindo em frente.

Zecar
Enviado por Zecar em 27/05/2005
Reeditado em 28/05/2005
Código do texto: T20044