RETIRANTES

"... Nóis vamo a São Paulo Que a coisa tá feia.
Por terras alheia. Nós vamos vagar ..."

                                                          Luiz Gonzaga

De como o sertanejo
Perde o seu amor pela terra
Vasculha a várzea estorricada
Cavando o chão
Embaixo de cada pedra

Vez em quando encontra
Uma raiz de macaxeira
Que ficou enterrada na vazante
Na época de chuva e de cheia

Mas tudo finda
O riacho seca
A planície descampada
Uma vastidão de nada
O peito também vira pedra
Parece que chegou o fim

E a alma nessas horas
Escorrega-se ao chão
Toda esperança se esvai
Resta apenas a dor e a poeira
Estrada e solidão
Mais nada

E o sertanejo se pergunta
O que será que acaba primeiro
A seca ou a família
Ficar e morrer de fome
Em sua terra querida
Ou emigrar e morrer distante
De humilhação de vergonha
E de fadiga

O caminho se desenrola
Como uma fita empoeirada
De vez em quando uma cruz
Marca na beira da estrada
O fim de um retirante
Que a essa hora já descansa
Da seca do eito e da enxada

O horizonte vermelho
Se abre agora num clarão
Ensangüentado de brasa
No céu nem sequer uma nuvem
Nem sombra
Nem gente
Nem nada





Do meu livro "Pássaros de Fogo".