(Navio negreiro de Rugendas)

Poética Negreira

Navios negreiros fétida lembrança, devido à melatonina a herança de um povo maltratado, mas, tenaz, cubículo impregnado no âmago de minha mente, inenarrável dor me traz;

Gritos suados, farrapilhos de gente amontoados, rumo a um destino traçado pelo capataz, mar ingênuo afogando nossos sonos, sonhos, emergindo vil metais, o único ensejo daqueles homens, que com a dor de outros sem direito nem a nomes acumularam capitais;

Do mar de dor ao maior martírio, maltratados em meio ao cultivo, dos tubérculos, dos legumes aflitos, das verduras, dos grãos sem paz, o chicote era o incentivo, costas em chagas o comum aviso ao desavisado mais audaz;

Quando a noite silenciava os gritos, dança de roda, feijão cozido, com tripas ensebadas, saudade não me traz, engaiolados sem aviso, sem eira nem beira só com um desígnio, a liberdade de outrora não mais;

Vi parentes sem forças sumindo, amigos se despedindo, em meio ao sangue tão igual aos demais, não entendia o porquê do domínio, esse era meu maior desatino, Deus escutou os pedidos, misturados aos constantes gemidos, por saber que éramos iguais;

Tronco do ardor no pátio erguido, chibata sem pena apurada com sais, negros fujões enterrados vivos, castrados, as palmatórias sem alívio, azeite quente tortura voraz, gloriosa lei nos devolvendo um sorriso que há muito estava preterido ao ranger mesclado aos ais;

Sou um resquício de um passado escondido nas vielas do que não me apraz, porém, hoje exclamo incontido, um por anos silenciado grito, nossa cor não nos diferencia dos demais, perdôo o que fizeram comigo e com os outros que ficaram para trás, racismo pior inimigo transmutados em um capataz.



 
Poesia vencedora no Concurso Nacional Novos Poetas Prêmio Poetize 2015 e publicada em Antologia Nacional.





 
O Poeta do Deserto (Felipe Padilha de Freitas)
Enviado por O Poeta do Deserto (Felipe Padilha de Freitas) em 21/10/2010
Reeditado em 20/12/2014
Código do texto: T2569313
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