Que raça somos?

As crianças nos faróis,

As prostitutas meninas,

Os peixes nos anzóis,

As subvidas nas esquinas.

Que raça somos?

Os assassinatos por dinheiro,

A morte pela fome e pelo frio,

A miséria no mundo inteiro,

A vida-morte-desafio.

Que raça somos?

Um irmão que pede ajuda,

Uma mão que estendida esmola,

A desigualdade tão aguda,

A corrupção que a tudo assola.

Que raça somos?

Os trabalhadores das minas de carvão,

A indústria da seca no Nordeste,

Os pobres em regime de submissão,

Os ricos que se alimentam desta peste.

Que raça somos?

As guerras por petróleo e ganância,

As mortes pelo poder total,

Os atos de extrema arrogância,

Provas para o Juízo Final.

Que raça somos?

Os lugares do mundo ainda preservados,

Povos distantes da re (pro) gressão tecnológica,

Seres humanos esquecidos e massacrados,

Vítimas da política social demagógica.

Que raça somos?

Salários que minguam a cada dia,

Propinas que brotam em férteis terras,

Vidas secas e sofridas com porfia,

Vidas fartas que se alimentam das guerras.

Que raça somos?

Sangue derramado no violento asfalto,

Champagne degustada nas salas de estar

Fim de sonhos terminados num assalto,

Sórdida embriaguez de poder a nos matar.

Que raça somos?

Culturas esmagadas e perdidas,

Outras que se impõem violentas e arrogantes,

Nações que se curvam covardes e vendidas,

Aves de rapina que se aproveitam das carnes dilacerantes.

Que raça somos?

Vidas salvas por mortes destinadas,

Mortes compradas por vidas mesquinhas,

Almas perdidas e pelo mundo penadas,

Corpos em autoprisões de frágeis linhas.

Que raça somos?

Periferia suja, esquecida e sangrenta,

Vidas do Bem precisadas e do Mal dependentes,

Zonas centrais limpas, belas e nojentas,

Vidas ao Mal presas e do Bem carentes.

Que raça somos?

Vidas mortas em fratricídio,

A morte que se alimenta de vidas,

O mundo é um banquete em genocídio,

O Purgatório lavará as feridas?

Que raça somos?

Desrespeitadas todas as religiões,

Extremismos e ultrajes graves ao Senhor,

Radicalismo despeitado de algumas nações,

Nem Deus suporta tanta dor.

Que raça somos?

A Natureza há muito e em muito devastada,

Um Ser que não se compreende parte da biodiversidade,

A tecnologia para o Bem, mal; e para o Mal, bem usada,

A vida sobrevivida a toda calamidade.

Que raça somos?

Uma raça que sobrevive e que luta,

Uma raça que seu próprio irmão mata,

Uma raça que ri e que chora a Dor Absoluta,

Uma raça que vive pelo sonho, pelo ouro e pela prata.

É essa a raça que somos.

Uma raça que paradoxalmente se contradiz,

Uma raça que precisa e não crê na própria raça,

Uma raça que apesar de tudo quer ser feliz,

Uma raça de extremas penúria e graça.

É essa a raça que somos.

É essa a raça que somos,

A raça que traça os próprios caminhos,

A raça que inconseqüente sofre os desatinos seus,

A raça que planta flores e colhe espinhos,

E por isso mesmo a raça de Deus!

Cícero

Cícero Carlos Lopes
Enviado por Cícero Carlos Lopes em 22/11/2011
Reeditado em 19/05/2012
Código do texto: T3350145
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