olhar Hurbano

vi a cidade rebelde

feita de barulhos e sujeira

volátil, luzes piscantes

fachadas inquietas

cidade da revolução pululante

tantas ideologias

estampadas em canecas de café

presenciei a repressão

Che Guevara preso na vitrine

o Rosa tentarem proibir

torturarem Neruda pelos cantos

vi Drummond livre num estêncil

e a cidade engolir, nas ruas, o jovem

e soltar um arroto fumacento de bomba

assisti aos matutares das mentes

criminosas criadoras e as gloriosas reproduzentes

vivenciei todas as fases do amor:

do fora de moda, ao ridículo e o sintagma puro

conheci várias versões da história

nos livros, nos muros e em meus olhos

a cidade é um mundo todo ela mesmo

e os carros batem, revolucionam

as buzinas tocam, gritam pela liberdade de passar

a cidade revoluciona a si e a nós mesmos

que pensamos aventureiros, tristes

e sonhamos pouquíssimo acordados nesses dias

vi tudo e racionarem ainda meu sono

campo livre e natural de nossos sonhos

senti o cheiro nosso próprio, cheiro de medo

abri os olhos para a janela e senti enorme pena

da rua, das mães e dos pais, das pessoas

e dum pequeno meu reflexo, no vidro sujo

que se faz, nestes tempos, de espelho.

Vinicius de Andrade
Enviado por Vinicius de Andrade em 29/12/2012
Código do texto: T4058324
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