Menina que paria poetas
Só havia um caminho
Ela sentia muita dor
As fissuras na terra seca
Pareciam romper seu destino
A tarde vermelha com a poeira
Movia rochas com estigmas milenares
A inundação vazia trazia de volta
Suas moléstias da infância abortada
A loucura derredor e a insegurança
Fez girar o mundo ao avesso.
Pesadelos dissipam o seu sono
A inquietação fez pequeno
Seu leito de pobreza e varas
A dor aumenta e traz com ela
O líquido nutritivo da vida
Que ainda não respira
A escuridão chegou para ficar
Animais de rapina
De hábitos noturnos
Devoram o que sobrou do dia
A violência do incesto
Fruto amparado pela desgraça
Traz de volta a dor
Entre as pernas
Das profundezas uterinas
Desabrocha o tesouro
Rompe a linha da vida
Da miséria exacerbada
A arritmia do canto triste
Esvai-se ao longe
“Boi, boi, boi
Boi da cara preta
Pega essa menina
Que tem medo de careta”
A dor se multiplica
O corpo sem força é sugado
Ordem natural e biológica
A batalha pela vida sem vida
A vinda ao mundo da poesia
Ela só tinha 14 anos.