A S I N A, NÃO ASSINA A HISTÓRIA

Contemplo certo quadro em sintonia

De um filho que conversa com o pai.

Contempla pensativo o inocente

Do pai debalde o choro e a agonia.

Enfim o velho homem se assossega.

Honrando o nato dever de ensinar

Ao filho que o cabresto é inerente

Àquele que foi feito pra o usar.

Meu filho é obrigação de toda gente

Cumprir, obedecer e se aquietar.

Manter curtido o lombo pro açoite,

E a mão bem calejada pra roçar.

De nossa estirpe sai a ferramenta

Que enlaça um sistema milenar.

Que dá o trono a quem nele se senta

E nos devolve os olhos pra chorar.

Nós somos d’uma linhagem mui remota

Seu pai, seu tio, seu avô, seu ancestral.

Cumprimos nossa sina persistente

De firme posição que não se embota

De preservar o mesmo, bem ou mal.

Pois eu já fui plebeu, ralé e vassalo.

Fui proletariado e retirante um dia.

Sou apegado, hoje, à maioria.

E sem saber falar, logo me calo.

Se alguém de mim se ri, eu não reclamo!

Se me dão uma esmola, logo aceito.

Acho mesmo que pra mim não tem mais jeito!

Meu nome é Zé Ninguém, assim me chamo.

O filho inconformado estremece,

Tal qual o potro novo corcoveia.

Porquanto tão injusta a dura peia.

Fechar o cenho ao pai, não se atreve.

Porém com o sentimento embotado

Correu ao vil casebre e encontrou

Um velho violão desafinado que

nos braços do seu pai acomodou.

O homem vendo o filho atordoado,

Com os olhos marejando de emoção

Viu, Já no primeiro acorde arrematado,

Que não é João Ninguém, quando se ama,

Nem pouca a riqueza que se tem.

E abraçado ao pinho se espalma,

Malgrado o que trazia na memória

Conclui que a sina não algema a alma

Pois cada qual perfaz a sua história.

Kleber Versares
Enviado por Kleber Versares em 24/03/2014
Reeditado em 30/06/2017
Código do texto: T4742037
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