O Medo de Não Parecer Bonito

Eu finjo estar bem…

Finjo escutar que os deuses dobram seus joelhos

Finjo não sentir o pus nas queimaduras

Finjo que a dor é um acessório ao qual não tive acesso

Finjo conhecer muitos caminhos

E finjo ter fraca memória para não ter de escapar por uma piada

Eu finjo consonância com a noite

Mas nem tento fingir que isso não é um suicídio progressivo

Há quanto tempo me deixo ser convencido à vandalizar minha própria vida?

Sempre sintonizando a versão clandestina desse show

Eu finjo me nutrir com o pragmatismo

Eu finjo cada vez que me aconselho à não desistir

Finjo entregar a chave para o meu amor

E depois finjo que minutos são dias e que horas são meses

Eu finjo um dia fresco de céu azul

Finjo não me preocupar com suposições

Finjo que realmente serei o único a exercer a lealdade

Mas não posso fingir que não gosto quando o último drink é o esquecimento

Não desobedeça os bons costumes

Não desobedeça a revolução

Não desobedeça a estagnação

Não desobedeça a estética

Eu finjo não estar cansado de fingir

Eu me convenço de que algumas velhas lembranças são mais do que o necessário para me medicar

E agora estou vendendo essas páginas que deixei em branco

Eu nem tento fingir que esse jamais foi meu grande medo