Sois um vento que passa
Não tinha voz o menino da rua
Andava pela praça
Com sua mãe quase desnuda.
A roupa lhe davam sempre
Não durava duas noites.
Homens
Que não com açoites
Mas um sem fim de hipocrisia
Bradavam-lhe vozes
Como se dirige a um cão.
Não se digere senão ao ouvir a voz da rua.
O menino que anda a vida pelos cantos de hotéis
Que pede esmola.
Não sabe, enfim, quando chegará sua hora.
Não conhece o tempo, apenas suas marcas.
O amor
Em tantos desesperos
Nunca o entendeu
Talvez isso fosse de santo,
Pois não podia ser ateu.
Conhecia a dor
Sussurrava ao pé do ouvido da mãe.
Perguntava a ela se iria conseguir dormir
tanta dor,
Uma dor desgraçada, uma dor de dente.
Há quem se contente
Passe do lado e ri
Ri da dor de uma criança
Pra esse tipo de gente, no céu não há esperança.
Sopas e pães e roupas
Vivia no ciclo da agonia
Não sabia para o que vivia.
Sois um vento que passa, menininho.
Não é um bicho
Está mais para um anjinho
Com tuas vestes sujas e os pés ardentes de asfalto.
Com as tantas repetidas vezes que dormia ao frio
O rapazinho foi aos poucos se entregando
Já não corria mais
Não sorria
Não entendia a vida.
Aos braços de sua mãe,
Numa noite de chuva de Belém
Deitados em um papelão
Deu boa noite a ela
Fechou os olhinhos
E foi a voar.
Passou pelas nuvens
O ar gélido não sentia mais.
Estava vivo
Vivo como nunca
E Alcançou os céus,
Sentou ao pés do criador.
E chorando pediu pela sua mãe
A única pessoa que o amou.