Enquanto...

Enquanto nós fudemos

do lado de fora o tempo não para

os carros perdem muito tempo parados

em congestionamentos intermináveis

pessoas enfadadas do trabalho exaustivo

só querem chegar em casa e mais nada

os metrôs disparam de uma ponta a outra

da cidade e ainda não dão conta

jovens com insônia

nos altos edifícios de ferro

e concreto se viram de um lado

para o outro na cama

esperando ansiosamente

dar o efeito do remédio.

Enquanto nós fudemos

há quem chore, há quem brigue

e pior de tudo, há quem não sinta o amor

há pessoas em todo canto fazendo guerra

espalhando o ódio e o horror.

Enquanto nós fudemos

litros sangue são derramado

nas calcadas a troco muitas vezes de nada

mães ficam sem filhos

filhos tiram a vida dos próprios pais.

Enquanto nós fudemos

do lado de fora tudo é solidão

há pessoas famintas nas ruas

dormindo ao relento

comendo no chão

sem identidade

invisíveis para sociedade

sujos e fedidos

de olhar distante.

Enquanto nós fudemos com força

já quase gozando de prazer

há um mundo preso em si mesmo

mendigando migalhas

de pertencimento

que por mais que a gente procure

não consegue ter.

Enquanto nós fudemos

nosso gozo escorre pelo ralo

desce pelos canos do prédio

sem destino certo

em direção ao abismo

e aquele prazer que antes sentimos

já não nos incomoda mais.

E depois quando a divisão

da nossa intensidade acaba

o que perpetua entre nós

é silêncio, é o espanto

é filme de terror.

Eu não reconheço mais seu corpo

e você não reconhece mais o meu

então nos esquecemos

e viramos cada um de costas

para o outro

agora eu só quero ficar sozinho

mesmo com você perto de mim

então olho pela janela do apartamento

fecho os olhos

e tento a todo custo dormir.

Dante Santana
Enviado por Dante Santana em 04/08/2019
Reeditado em 16/09/2019
Código do texto: T6712522
Classificação de conteúdo: seguro