Senzala

- Quirino!

- Uquê, Salatiel?

- Tá iscuitano?

- Uquê, home?

- Lá fora tem choro, parece choro de minino, isso já acunticeu

in antes, tô cum sintimento rúim...

- Sintimento duquê home?

- Cê alembra di quando os cativo da pânha di café quizero fugi,

ocê alembra?

- E ei de isquecê!

- Pois num é, essa noite tá ingualzinha!

- E uquê qui nos pode fazê a num se rezá, tamu aqui trancado nessa

disgraça de senzala!

- Intão vamo pegá cum nosso Sinhô do Bom Jesus!

- Salatiel!

- Uquê, Quirino?

- Fez silênço, acho qui tamo é sismado, nós sofre tanto, qui tudo é

mutivo de sofrê, mais Deus há de cuidá de nós.

- É sim, só eli pá tê pena desses infiliz.

- É mió deitá, tá tarde, amenhã a lida é grandi.

- Intão vamo.

- Quirino!

- Uquê, Salatiel?

- Acorda qui o dia já clariô, iscuita só o cunvecêro qui ta lá fora!

- Qui cunvecêro home?

- Sei não, acunticeu arguma coisa.

- Causa duquê?

- Sei lá eu sô!

- Intão vai lá fora, ispía, já abríro a porta da senzala.

- Quirino, num ti falei, onte naquela ora o disgraçado do feitô tava

era levano os cativo da cana pu trônco, ês num tivero nem dó

dos minino, eu iscuitei os choro dês.

- Quem quês levaro Salatiel?

- Falaro numa ruma dês.

- Mais quem, home?

- Sei não, só dicero qui dois morreu.

- Dois quem?

- Lutero e Damião.

- Meu Deus, inté qui dia vai cê esse sufrimento?

- Sei não Quirino, só Deus é qui sabi...