A Lavadeira

A senhora quer um vestidinho lavadinho para o fim de tarde

Há chá às cinco, com as mulheres

E o vestidinho lavadinho que ela veste agora

Não se dá com os mocassins que ela quer calçar

Então lá vai a lavadeira romper os joelhos

Na borda do rio

Naqueles pedregulhos impiedosos

Com as mãos ensaboadas na água gélida

E paralisante

É inverno

Ou verão

Não importa quando se é pobre

E o pouquinho mal chega

O frio mata, o calor esfola

"Mas o pão custa dinheiro", lamenta a lavadeira

Então esfrega o vestidinho

Para à frente

Para trás

Até o branco esbranquiçar

E criar um novo branco

É um afazer tão antigo que foge ao tempo!

E olha que a moça fá-lo tão bem

Ah! Que gosto dá vê-la a trabalhar

Que talentosa que ela é

Nasceu a saber, com certeza

Pode ser que mereça um soldo

Ou dois, se Deus quiser

Aquele corpo prenho e barato

Aquela pele queimada do sol

Aquele buço moreno e sobrancelha eriçada

O sovaco húmido, o vestido desmazelado

O cravinho que traz ao peito

Que não disfarça o bedum

Ela é menina mas já manca

Tem a voz rouca de cantar rimas de pobre

Não lhe perguntei o que pensa

Nem acho que tenha tempo para pensar

No que pensa

Nunca lhe deram tempo

Nem lhe ensinaram a pensar

Nunca ninguém quis saber