O DIA QUE EXISTI
Existiu a vida, existiu o amor, existiu ele.
E na vida, existiu a decepção.
E aqui, bem aqui, existe o cadáver de uma pobre criatura.
Eu existi.
Meu coração mastigado ainda ousou em pulsar.
Pareceu mero atrevimento, só insisti em sobreviver.
Como lepra a maldição tomou meu corpo, enquanto meus podres órgãos exalavam um odor fúnebre.
Não imaginara que a minha frágil pele pesaria tanto sob meus músculos.
O que vem depois da solidão?
Onde se esconde os deprimidos?
“Criatura que se esconde nas sombras, venha à luz para que eu possa ver suas feridas.”
Ó, voz que em meus ouvidos sussurra e em minha mente paira, diga-me, ao ver minha decomposição recolheu meus restos mortais e queimou-os no fogo da misericórdia?
Minha alma não poderia estar tão contente ao livrar-se do tormento das noites intermináveis.
E, ao ver em cinzas o que pertenceu ao meu corpo de carne, o cantar mórbido do corvo transformou-se na canção viva do rouxinol, no dia de flores amarelas.