Melancolias e Alguns Versos VII

Tamanho é meu ânimo,

Que nem consigo cortar os pulsos,

Deixando ao órgão antônimo,

O dever de sublimar os meus soluços

Ao meu estômago, todo o pesar foi imposto

Já que o coração está de licença, indisposto

Minhas pálpebras não disfarçam o desgosto,

Por mais que eu volte para baixo o meu rosto

Decidi não mais chorar

No máximo, permito meu esôfago arrotar

A tristeza que a mente não consegue derrotar

E minhas tripas não digerem, não adianta orar

Faço poesia,

Para não morrer de apatia

Vagando feito um espírito perdido,

Cuja vida não tem o menor sentido

Nem do corpo, nem da mente,

De nada disso estou doente

Prefiro vomitar a minha indignação

A ter que engolir a minha alienação

Estamos todos igualados

No mesmo rebanho de condenados

Tentando sorrir mesmo amordaçados

E não enlouquecer de olhos vendados

Não passamos de miseráveis mutilados,

Um pouco por dia, sendo desmembrados

Talvez, no fundo, querendo viver

Mas nossas carcaças estão a perecer

Vivendo vidas que não podem ser cantadas

No máximo, em versos mórbidos, lamentadas

Pai, dê-me logo esse cálice, tende piedade

Deixe-me beber, do veneno, a liberdade

Minhas lágrimas já desceram pelo esôfago

Passaram pelo coração e caíram no estômago

Convertidas no ácido castigo do meu sofrimento

E nos filamentos de sangue do meu excremento

Meus interiores cheiram mal,

Estou me desintegrando

Quisera poder estar me libertando,

Mas a verdade é ainda mais brutal

Com a morte iminente,

Quisera eu estar com medo,

Mas minha mente está tão ausente

Que minha vida se torna brinquedo

A noite, vestida de escuridão,

Paradoxalmente, devolve-me a razão

E com a graça de Deus, o medo me visita

E lembro-me, certamente, de que estou viva

Dispenso a autoconfiança

Um delírio na mente dos loucos,

Um baú de ouro dos tolos,

Armadilha, essa, que não me alcança

O laço do passarinheiro,

A peste perniciosa,

Consome o homem ligeiro,

Essa perdição da alma orgulhosa

O frio na espinha é minha imunidade

Não que isso faça de mim uma covarde

Setas se partem antes de me atingirem

Pois permito meus sentidos se afligirem

Assim, mantive-me longe dos meus predadores

Embora, sendo rendida pelas minhas dores

Nem que fosse para assistir minha auto derrocada

Vendo meus ossos se contorcerem, dando risada

Todo e qualquer esforço é inútil

Mas, para o homem, é uma desculpa útil

Se toda a vida tivesse uma razão de ser

A humanidade não estaria a enlouquecer

Dor e silêncio regem a noite

Meus olhos vagam sozinhos pela escuridão

Minha carne aguarda passiva sua danação

Feito um condenado aguardando seu açoite

Estou de braços abertos, no chão

Sou uma cruz a ser carregada

Pois estou farta de lutar por uma ilusão

E cair de joelhos, sempre envergonhada