Versos de.o pó

Ainda há veneno

E o cheiro do sangue na terra.

Ainda há pólvora...

E vida em meu sangue

Ainda declama minha alma

Versos,de pó e indignação

Versos de ferro e fogo

Rimas de grilhões e crueldade

Na métrica da curta vida

Das dores longas

Da morte certa.

Sim...

Ainda entoo canções sóbrias

De tristes dias

À pão e água

Temperados na saudade

Da terra distante

Meu berço além mar.

Meus versos de pó

São este batuque

São pedras saindo

Das veias da terra

São massapê arado

São rios de negro ouro

Bebido por nobres

Meus versosnobres

São o silvo do vento

Na folha da cana

Que nada adoça

A vida que levo

O sonho que tive

Roubado que foi.

Mas eu não me calo

Do pó me levanto

Entoo meu canto

Tristonho, que o digam

-ora, são versos de pó !

Que quereis em meus versos?

Se escritos com sangue

Destilado nos porões

De um maldito tumbeiro

Canalizado pelas eiras

Nas valas de irrigação

Dos cafezais terra a dentro;

Que esperais vós deles?

Se entalhados madeira

Dos troncos de castigo

Nas fazendas e fetorias;

Se elas são páginas mortas

Escritas em pás, picaretas,

Ou na silicose -hó desgraça !

Que rouba o ar ao pulmão

De meus filhos e irmãos

No ventre da terra

Que pari pedra brilhosa

Cobiça dos brancos

Ruína de muitos

Riqueza de poucos

De poucos se lembram

Do pobre menino

Sem pai, pão, ou travesseiro...

Sem mão que afague !

O lanho a verga

Na derme da alma

Retinta, de mágoa;

Na face sugada

Do homem marcado

- pobre maldição -

A raça humana...

Matando a raça humana !

E Deus ignora ?

O santo consente ?

- clama, filho das correntes,

Lança sua voz lamentosa

Não haverá no panteão

Divindade que veja

Das mãos os calos

Do corpo as farpas

Hó desgarrados de Benguela?

Não acharás ouvidos

Para meus versos de pó ?

Pois derramareis na terra

Vossos ais entre as eiras

Quem sabe germine

Quem sabe Florença

Igual imbombeiro

Do chão que viestes ?