Desesperadamente brasileiro

Conheço um cara que é da noite,

da madrugada,

Igual ao rap antigo

Mas só até aqui

A noite é feita para quem pode

Dormir é para quem paga

As contas, o pão e o leite

A maioria passa a noite em claro

Não literalmente. A luz é cara.

Inteiramente ocupados

Em contar miséria,

Em juntar moedas

E não ter o suficiente pra ser pobre

Desesperadamente brasileiros

Do norte, ou nordeste

Ou de outro Brasil mais distante

Cabra da peste, cascavel de vereda

Não dorme nem cochila

Trabalha o dia inteiro

Pra folgar no fim da vida

À noite faz bico de todo tamanho

Só não dorme,

Só não come

Muito menos sonha

(E dá tempo de sonhar?)

Muito menos vive

A madrugada é de luta

O trabalho é (quase) de graça

O dia apenas passa

- E passa!

Para aliviar o cansaço

Da existência sem vida

Num Brasil esquecido

Sem salário que sirva

Sem horizonte que diga

Vai ser melhor,

Vai ser mais fácil