Gauderiando/Baianidade/Carioquês

Esta mesma história fictícia é aqui contada em 3 "dialetos" do mesmo Português (Gauderiando/Baianidade/Carioquês).

É claro que não se trata de crí­tica a qualquer uma das naturalidades, sendo antes uma homenagem à diversidade cultural desse nosso imenso paí­s.

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Gauderiando

O que eu sabia dos pampas

Estava em livros de história

E veja que minha memória

Borracha de meia guampa

Só me falava "churrasco"...

Um quera tocava uma gaita

Eu com u'a fome baita

E medo de fazer fiasco.

Dez pila e só, na guaiaca

Imaginava a distância...

O dono daquela estância

Na cinta tinha uma faca

Olhava lá da porteira

Com o rebenque na mão

E eu que nem um lebrão

Já preparava a carreira

Foi quando olhei o piquete

E exclamei: tri-legal

Eu monto o pingo bagual

E vou parar em Alegrete.

Mas só que o pobre animal

Mais rengo que cusco velho

Nem que dissesse o evangelho

Chegava além do curral.

Então chegou-se a guria

Vestida qual uma prenda

Com laços e muita renda

Voz doce que nem chimia

E nem te conto, patrão

Passou-me a bomba e a cuia

E eu pensei "ha ha huya"

To pronto prum pelotão

E eu já me vi no fandango

Garboso, todo pilchado

Por minha prenda laçado

Dançando xotes e tangos.

E fui até a alvorada

Nesta bailanta fagueira

Deixei a prenda faceira

E a famí­lia aumentada.

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Baianidade

Cheguei de mala e cuia

Lembrando nadica de nada

A mente meio anuviada

Zoada de tanta fubuia

Soprava assim "vatapá"...

Um cara a tocar berimbau

De fome eu já tava mal

Vexado pra não me danar

Dez contos em meu bocapiu

E eu já contava as léguas...

O dono daquela bodega

Nem sei o que foi que ele viu

O cara era uma figura

Jogava a maior capoeira

E tinha uma bela peixeira

Ajeitada na sua cintura

Foi quando eu ouvi um jegue

Pensei comigo: "Aonde..."

Eu vou me picar para o Conde

Com sorte ninguém me segue

Mas quando eu vi o animal

Valei-me Senhor do Bonfim

Dois caçuás de aipim

Não chego nem no portal

E aí­ surgiu a menina

Com sua roupa de renda

Cheirosa que nem oferenda

Em festa de Janaí­na

E eu nem te conto, meu rei

Me deu um doce de côco

Menino, eu fiquei louco

Pra nada mais eu liguei

E eu já me vi numa festa

Nos trinques, bem arrumado

Com minha linda do lado

No Olodum ou seresta

Dançar até de manhãzinha

No dengo eu logo me achego

E o fruto do nosso chamego

Quem sabe, mais u'a baianinha

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Carioquês

Eu tava naquela parada

Na minha, deitado no banco

A mente até deu um branco

De tanto que estava mamada

Dizia pra mim "feijoada"...

Um cara batia um pandeiro

Eu tava ficando cabreiro

E com uma fome danada

Só tinha no bolso dez paus

Queria poder "sartá" fora

O dono me olhando, e agora?

Pensava comigo: "Tá maus"...

O cara estava na sua

Vai ver era um faixa-preta

Quem sabe usava escopeta

Ou era de gangue de rua

Aí­ foi que eu vi a magrela

No canto, encostada no muro

Pensei em sair do apuro.

"Eu caio fora com ela

Me escondo lá no Vidigal"

Mas nem cheguei a fazê-lo

A trava prendia o camelo

Notei que não dava pedal

Então foi entrando a gata

Sozinha, dando bobeira

Vestindo uma roupa maneira

Ti juro que não é cascata.

Me trouxe um cachorro com molho

Malandro, pintou um lance

E eu não perdi essa chance

Sorrindo pisquei-lhe o olho

Já vi o baile rolando

Com beca de gente fina

E eu abraçado com a mina

samba e pagode escutando

A gente ali se deu bem

A noite então foi beleza

E para minha surpresa

Ela vai me dar um neném

Sérgio Serra
Enviado por Sérgio Serra em 11/05/2006
Código do texto: T154376