Mediano

 
 
Menino de roça é meio preterido.
Come no prato a comida que vem.
Caneca sem asa, bolinho repartido
(pirraça de preferir, continua sem).

 
Ali, menino é meio desaceito.
Quando embirra. Quando atenta.
Palavrão. Catarro na venta.
Perebas e um chiado no peito.

 
Menino, de meio apreço nem é.
Primeiramente, fica para o não.
Outros, o bolo; menino, feijão.
No sofá, a visita; menino, de pé.

 
Menino fica meio para depois.
Piora nos irmãos mais de dois.

 
Pedaço repartido da migalha.
Um tico da metade da talha.
O pé que se dê à sandália.
A mesa trincada sem a toalha.

 
Menino, meio que sem vez.
Ou tanto faz, ou tanto fez.

 
Ou não rezinga ui, ou engole o ai.
Ou a mãe impede, ou ralha o pai.
Ou desce daí, ou cuidado que cai.
Ou geralmente fica, ou nunca vai.

 
Menino meio que chupa o dedo.
Que dá prazer, dá-se por azedo.
É de gosto: é secreto, é segredo.
Atrasado; amanhã chegue cedo.

 
Menino, bem depois que cresce,
passa da roça e se acha no meio.
Salienta o corpo e, vira e mexe,
vê de cima e não sabe a que veio.




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Sem-Graceza

 
Cheiro de miséria, magreza
em cada fresta, cheiro de confusão
por qualquer "dê cá uma palha"...
 
Subterrâneos (eu acordo e, se me agarro
com tanta tenacidade pelos "pontos de descanso")
são por tanta exclusão, caminhos conhecidos
no repetir até muito mais tarde...
 
Quando com sem-graceza,
infância é feita e confirmada aos berros
que não servem pra nada.
Parece que nunca se acorda do pesadelo
— melhor nunca dormir.
Sempre com dor de cabeça...
Sempre tensão solidão precisão.

Sempre menino roendo unhas sujas,
roendo coração.
— Página  que me rasga
e deixa a mais funda emoção.

Deixa até vontade de continuar:
melhor morrer, que saber destes desaceitamentos
 — estes sentimentos
que pensei fossem só meus...

 
        
                                               (Arana do Cerrado — Interação)
Milton Moreira
Enviado por Milton Moreira em 16/04/2013
Reeditado em 02/05/2013
Código do texto: T4244541
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