UM ARTISTA MENDIGO

UM ARTISTA MENDIGO

Na madrugada vaga, o seu semblante

perde-se tristonho em divagações.

A revolta da pobreza errante

clama, inclusive pelas muitas decepções.

E tenho certeza que, nesse instante,

nasce o pulsar de tantas emoções,

e o seu adejo em asas tão flutuantes

enriquece o adoçamento das tensões.

Pervague, triste ser, na liberdade

da sua elevação, plácido momento

constante de beijo de hilaridade.

E mesmo pobre, só no sofrimento,

o milagre acena-lhe com bondade:

abre-se o sorriso do seu talento...

...................

Tudo que no interior é feito sob as bases de contradições transmite no exterior a podridão de seu estado e de sua futura decadência.

...................

Já ouvi dizer que poesia não enche a barriga de ninguém.

Palavras de ignorantes e de estúpidos...

Sabedoria de éguas e de cavalos!!

É necessário encher a barriga, é óbvio.

Mas isso não quer dizer

que se deva esvaziar a cabeça.

....................

Não basta um só humilhado para os oprimidos.

Não basta!

Não basta uma só letra a um poeta.

Não basta uma moeda à vida moída de um mendigo.

Não basta a felicidade a um só homem,

o conforto a um só homem.

O privilégio não pode existir!

Basta! sermos todos felizes,

basta! todos participarem

da letra que constrói,

da esmola que é a generosidade

e da felicidade:

riqueza tão grandiosa

que muito pode ser repartida...

.....................

Há uma bondade, uma simplicidade no amor das mães, na inocência da criança, na humildade dos excluídos, dos mendigos, dos verdadeiros artistas, dos subempregados; toda uma bondade que prenuncia, em meio a tanta violência e a tanta crueldade, o que será o homem edificador e pacificador do futuro. Pois, as energias das mentes oprimidas pairam sobre a Terra, inspirando os autênticos revolucionários a levantar a bandeira da revolta e da esperança, para que se estabeleça o reino do homem pacífico e construtor...

FERNANDO MEDEIROS

verão de 2006