DOR DE OUTREM
A pedra cai na cabeça do alheio. Dói.
Como dói fingir que constranjo.
Dói supor a solidariedade falsa que não bloqueio.
Dói o prazer defeituoso, escondido na alma obtusa que arranjo.
Na ajuda que presto dentro do vidro perolado
da hipocrisia que adestro,
dói a substância de raças que carrego
e que acendo o fogo a quem me entrego
pelo minuto mundano,
além da suposta justiça contra atos que me nego,
mas que desejo à margem da invídia que emano.
O pecado que não acolho renasce
na face de quem recebe o ferrolho
do enlace de minha inconsciência de humano;
por mais que queira um só rosto
sou sempre transposto em Jano.
O que nunca provei reside no meu abismo.
Bojo da máscara do sorriso de redenção.
Egoísmo de imputar que a pedra deixou de ser pedra,
modelou-se em aviso, imolou-se em provação.
Ah! Quem dera em mim o espírito que redra
que, sem meneios, me mostrasse o caminho
para que estes anseios tivessem seu desalinho.
Poderiam ser as asas de uma outra existência
ou os seios de um eterno moinho.
2006
www.alfredorossetti.com.br