John Scott

Nem conheço você direito,

Mas muito prazer.

Não tenho voz aqui,

Mas quando enveredei pelas ruas desses igarapés;

Mas quando senti o cheiro das matas nativas;

Mas quando, me deparei com a revoada dos pássaros na capoeira e

Caminhei entre as avenidas do Guajará ao Amazonas...

Quando vi Macapá...

Terras de Buritis;

Terras de Iaras, botos e Sacis...

Meu Deus!

Meu Deus!...

Disse cá comigo, no meu silêncio, o paraíso é aqui.

Senti-me dentro da vida,

Semente de várzea,

Comecei a parir no peito a dor do Bem-te-vi,

Comecei a nutrir na alma o apelo da selva;

Comecei a dividir com as lágrimas do rio a miséria dos ribeirinhos,

Que deixam a mata vazia, para andar sem rumo na cidade.

Sou turista sem terra...

Sou do norte abaixo do Equador,

Sou menino das palafitas,

Na ponte do Barreiro.

Meu amigo,

Não conheço a sua história,

Mas sei que a todas as horas

És guerreiro dessa senzala;

Dessa ilha bela;

Sei também, que és um Curupira,

Matinta Pereira, Mangueira, Taja, Mururé,

Arara Maracanã, lagoa dos índios, Curiaú,

Laguinho, Igarapé das Mulheres,

Marabaixo, rio Pedreira, Trem, Ferreira até o fim.

Ai de mim

Falar só do açaí;

Ai de mim falar só de capim.

Por aqui também tem pato no tucupi,

Tacacá, entre outras coisas, maniçoba.

Tem ladainha, tem Mazagão velho, o círio de Nazaré...

Pois é né São José!

Tem o Trapiche Eliezer Levy, o mercado do centro,

Cabralzinho em plena praça, o último quilombo da raça e as

Chuvas do Amapá, que faziam o Urubu da árvore cair.

Pontal das pedras, a festa da mina na Serra...

Serra do navio!...

Quem te viu?...Quem te feriu?...Quem ainda te vende?

E para não magoar tem o festival do camarão no Afuá.

Meu amigo vem ajudar, que essa vida é pra você e pra mim!

Não fique ai sentado a beira do poço,

Olhando o Tucano alçar vôo,

Pensando no fosso, que a homenagem de um desconhecido ao seu amigo,

Poderia ter iniciado por você.

Vou lhe dizer que poderia ter sido assim...

Ter sido assim...Fortaleza,

Ter sido assim...Fazendinha,

Ter sido assim...Araxá.

Não importa os recatos...

O importante mesmo é que como sonhador,

Temos o mesmo amor...

Esse pecado verde, no seio farto,

Dessa mãe pátria, chamado Amapá.

Filha de índio com negro.

Esse sangue vermelho Guará.

O importante é que mesmo que nos esqueçam,

Mesmo que não nos conheçam, somos a idéia viva,

De um futuro no amanhã desse imenso lar.

Assim olhando o céu azul,

Assim, como de quem não quer nada.

Assim, peixe assado no leite da Castanha,

Assim, meio Cupuaçu...

Meio dança, dança das andorinhas na encruzilhada das seis horas

Na padre Júlio, com a Candido Mendes.

Assim meio açaizeiro, meio urucúm com pimenta malagueta.

Assim, bate papo à beira do Apurema,

Assim, cardote com farinha, café ardendo na lenha.

Só não quero ter que continuar a vida como a maresia,

Apenas valsando os troncos de árvores... Vítimas das derrubadas;

Apenas valsando os troncos de árvores... Vítimas das queimadas.

O importante nessa vida é que os meus filhos,

Nessa ilha vasta e calma, deitem à cabeça e sosseguem meninos,

Com a brisa das nossas Ressacas;

Olhem o céu escuro das noites plácidas e vejam, por entre os cabelos embebidos,

No denso verde dessa mata, a lua, flor divina a desenhar a índia nua,

Ainda menina, banhando sem medo os seus cabelos negros nos leitos das cascatas,

Da Cachoeira de Santo Antônio.

Meu amigo John,

Apesar de tantos absurdos,

Dormimos na casa de palha,

Dormimos na casa de forno,

Dormimos na casa de Socorro e acordamos sob a lamparina,

Para beber água do pote;

Para Pescarmos Tucunaré no braço...

Para plantarmos uma palmeira.

Na verdade...

Que sorte, ainda morarmos no norte.

Que sorte, ainda termos a rede como dote;

Que sorte, ainda podermos dividir as nossas alegria

Com a preguiça, mucuras, beija-flores, Cutias,Tatus,

Cobras, vaga-lumes e sapos cururus.

Afinal o destino de cada um é o seu marco;

Afinal o destino da cultura é o seu traço;

Afinal se não preservarmos na abundância,

Amanhã nem teremos na cidade,

Motivos para ver nascer uma flor no pasto.

Os meus filhos...

Que são abençoados,

Pois são herdeiros do poço do mato, do canto do Japiin,

Do Vôo da Garça, dos bicos de Guarás, do passeio de

Barco a remo, da Araguari, das nossas lendas, do Marabaixo...

Dessa raiz cabocla, que é, na democracia pálida, a liberdade

De qualquer pássaro num voo razante no silênico do infinito.

Alberto Amoêdo
Enviado por Alberto Amoêdo em 04/08/2008
Reeditado em 05/08/2008
Código do texto: T1112839
Classificação de conteúdo: seguro