Afetada
Nos dias em que a alma está descuidada,
as palavras saem desgovernadas,
parecem querer furar olhos da razão;
têm um jeito arrogante e fala afetada
debruçam-se nas horas, dão gargalhadas
ou fiam rosários de lamentação.
Nesses dias de descarado desleixo
picoto prosas, me rasgo em poesias,
tenho enxaquecas de saudades
passo horas apoiada sobre meu queixo
enjoada pelas minhas maresias
e o corpo martelando tantas vontades.
Nesses dias de alma trincada
não pela fome, como se come!
Balas, bombons, chocolates,
nada preenche a alma varada
desse vazio que consome, e não some,
falta coragem e sobram ataques;
de choro, de agonia, de carência,
as mãos transpiram, o corpo se revira
entre soluços e voz arquejada.
Um delírio, uma febre doida
e as letras fervem, borbulham;
instinto puro de sobrevivência,
salve-se quem se vira
já que a vida é um quase nada
que explode em cada dia, afoita
por sua mera complacência.