CINZAS

Sinto cinzas amargando em minha boca,
amortecendo todo o gosto e a alegria
do presente que o passado influencia,
do futuro que antevejo triste e pobre.

Esse travo, que a boca anestesia,
traz de volta o dissabor do desconforto
de um tempo que passou e que está morto,
que não quero, nem em sonhos, me lembrar.

E eu luto e me rebelo esbravejando
com um ardor e uma força tão intensas
que estremeço no entrave do combate,
que enfraquece, debilita e me abate,
num espasmo de esperança e recompensa.

Mas não vejo resultado imediato
do esforço que despendo nessa luta,
pois aquilo que pensei ser só saudade
transformou-se, transformou-se na verdade,
numa ardente, numa intensa, imensa chaga
que me queima, lentamente, e não se apaga.