Estava escrito II

Estava escrito na areia

da praia à qual iríamos voltar.

(Mas na areia não conta,

que sempre vem uma onda

pra apagar).

E em letras garrafais

nos gritos, nos ais

de prazer.

Nos livros que me deste pra ler.

Na sala desocupada do andar vazio,

no prato de sopa, edredom e frio,

na madrugada do supermercado,

na escada deserta do shopping lotado.

Na linda montanha, inverno em novembro

(eu lembro das luzes brindando o Natal)

e no litoral, verão em agosto

(eu sinto o gosto do vento e do sal).

Na pousada à beira do lago.

Na fachada, na esteira, no afago

que vicia.

Na tua azia e no teu sono,

Na tua sede de mate,

na fome que não se mata:

a minha de ti

e a tua de mim.

Também estava escrito assim.

Nos nossos treinos de inglês,

no nosso reino, na nossa insensatez,

até nas nossas brigas estava escrito.

Ficou o dito pelo não dito

nas entrelinhas.

Ficaram as letras,

sozinhas.