O IMPERFEITO

Irretocáveis

eram os versos do poeta!

Secos, direitos ou verossímeis,

pareciam mais uma equação de língua

com a qual quisemos, um dia, demonstrar

a lógica matemática do Teorema de Pitágoras.

Impassíveis

eram os gestos do poeta!

Sem beber, fumar ou transpirar,

seu único delito em falsete, anacrônico,

foi deixar cair os óculos até a ponta do nariz

para que a soberba da voz o pusesse no lugar

sem anarquizar o contexto professoral da teoria.

Consciente de que as vistas jamais iriam embaçar

sua monocórdica voz nem de pigarro sofreu.

Sem hálito, nem cheiro de folha doce,

abriu o livro e, burocraticamente,

leu os textos impressos sem erros de revisão.

Impecável!...

Imaginou quando abafou as folhas, o poeta,

calando o livro com todo cuidado para a memória não partir.

Irretocável!...

Imaginou quando contou silabas no dedo, o piano,

cantarolando a métrica perfeita no branco e preto do dormir.

Não creio nos homens que apagam espelhos

que desprezam a melodia taquígrafa da caneta

que não derretem a língua numa bola de sorvete

que não arranham a lente dos óculos na escuridão.

Não acredito nos poetas que transpiram imperfeitos,

ou naqueles que respiram a morte quando abraçam a solidão.